Registro XXII — Coniglia Cornelia & o Buda: Capítulo I ~ O convite

Bhuvi Libanio
3 min readNov 3, 2023

Sem fronteiras《registros aleatórios de uma jornada não planejada》

Estava em pé, à porta do mercado e esperava duas amigas que terminavam de fazer compras, quando, pela primeira vez, avistei Coniglia Cornelia. Ela me encarava com seus olhos rubi, enquanto as orelhas longas pareciam acenar para eu me aproximar.

Admito que primeiro olhei ao redor para ter certeza de que era comigo. Depois fui até ela — sentia em mim um sorriso largo, uma fisionomia de criança; acho até que dei uns saltos de alegria. Quando estiquei meu braço para alcançá-la, o mundo mudou de cor, ficou mais exuberante, os aromas destacaram-se e não havia barulho. Toquei-lhe com a ponta de um dedo — eu não sabia se eram espinhos o que lhe cobria o corpo verde e oval — e o tempo assumiu outra velocidade. Senti uma risada brotar e um coração pulsar, sem saber se isso era nela ou em mim. Não tínhamos para onde ir. Não havia outro lugar onde estar. Nada era tudo o que tínhamos a fazer. Havia equilíbrio e paz.

Foi então que ela soprou-me seu nome.

No caminho até em casa, entre curvas e lombadas, eu conferia se ela estava bem. Ela, sempre em pé e firme, exalava ternura.

Tão logo entramos em casa, ela sentou-se e, do seu jeito peculiar, agradeceu-me. Anunciou que me ensinaria a observar os seis órgãos dos sentidos, os olhos, os ouvidos, o nariz, a língua, o corpo e a mente, para eu não me perder do caminho, porque os ensinamentos são a fumaça do incenso, que repele os insetos, e estes são os pensamentos, que nos tiram a concentração naquilo que verdadeiramente importa: o Amor, a compreensão.

Foi então que eu soube quem ela era.

No dia seguinte, quando alguns dos primeiros raios de sol se esforçaram e conseguiram atravessar as espessas nuvens que cobriam o céu, Coniglia Cornelia sussurrou:

– Essa é a luz! Ainda que o céu esteja nublado e você não consiga ver o sol, ele brilha. Saiba disso. Sempre amanhecerá. Esta é a luz! — a compreensão correta, o pensamento correto, a fala correta, a ação correta, o meio de vida correto, o esforço correto, a atenção correta e a concentração correta. Compreender que todos nós viemos do mesmo solo e para o mesmo solo voltaremos é Amor, é compaixão. Ignorar isso é espalhar tristeza, é causar confusão; ganância, inveja, arrogância, dúvida e ira habitam a ignorância. Amar é cuidar, conhecer a verdadeira natureza das coisas e dos seres e aceitá-la, é interessar-se pela diversidade de condições físicas, sociais e emocionais. A liberdade reside no Amor. Quem não ama aprisiona e permanece aprisionado.

Coniglia Cornelia fechou os olhos e sorriu. Nesse gesto, escutei:

– Aprendi com o Buda.

E aceitei o convite para caminhar.

“Apoie-se na pureza do Darma.”

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