Registro XIV — Croniqueta de sábado, no domingo: Café com pão

Bhuvi Libanio
3 min readJun 25, 2023

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Sem fronteiras《registros aleatórios de uma jornada não planejada》

Advertência:
Como toda crônica, esta é uma história de ficção baseada em fatos reais, por isso, os nomes das personagens não foram citados, a fim de livrar leitores e leitoras do pecado da curiosidade.
Ou não…
Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Na esquina mais movimentada do bairro, a dois quarteirões da praia, onde passa uma pessoa a cada dez minutos e ninguém encontra ninguém — no inverno –, o mercado aguardava a entrada de clientes, com as portas muito mais abertas do que as pálpebras do rapaz no caixa.

Eis que, a passos lentos, entrou uma voz suave, ecoando:

– Que / cheiro / bom!

– Opa! Boa tarde… — aqueles olhos, de repente, arregalaram-se.

– Hum… — ela disse, inspirando profundamente.

– A gente tem aquele — ele apontou para um ventilador — e aquele outro — apontou para o outro lado — que espalham esse cheirinho. Tem sido tanto sucesso que vende até pão velho.

– Aquele pão duro…

Ele riu. Ela seguiu.

De um lado, a prateleira de biscoitos, bolachas e afins. Do outro, duas geladeiras de sorvete vazias, uma prateleira de chips, uma de produtos naturais e finalmente a origem do aroma inebriante de pão.

– Boa tarde! — ela expressou, tão logo se voltou para a mulher atrás do balcão.

– Oi! — respondeu o sorriso coroado por uma touca meio branca meio transparente.

– Como você está?

– Bem — a atendente disse, depois de hesitar um pouco.

– Feliz?

– É…

– Não pensou sobre isso?

– É que… Feliz é um conceito que dá para debater. Porque a felicidade é momentânea, né? É um estado. Ninguém é sempre feliz.

– Ou… Quem sabe é uma característica? A pessoa feliz é feliz independentemente do que lhe acontece. É um ser feliz.

– Pode ser… — ela meneou a cabeça.

– As coisas não interferem na felicidade verdadeira.

– Bem… Viu como dá para debater isso? Vou pensar mais… E se você veio buscar baguete: não tem.

– Imaginei. Então me dê, por favor, cinco pães daqueles — apontou para a espécie de gaveta de pães — e um deste para cachorro quente.

– Esse é doce.

– Ótimo. Vai ficar uma delícia. Doce com salgado…

– Também dá para debater sobre seu gosto.

– Mas dizem que gosto não se discute.

Preenchendo o ambiente com risadas elas se despediram.

Quando a cliente alcançou a porta, malabarizando dois pacotes de pão, um de absorvente, uma lata de água tônica, uma vela, uma escova de dentes, um doce recheado de Nutella, foi impossível não reparar a respiração profunda seguida de “hum” que entrou no estabelecimento.

– Pelo visto os ventiladores aqui realmente funcionam — ela piscou para o rapaz, agora bem desperto.

– Viu só? Eu não disse?

E lá se foi ela, sacolas na mão, com um cheiroso pacote de, porque estava no Sul, cacetinhos deliciosos e bem quentinhos. Estivesse ela na Bahia, em Minas Gerais ou no Rio de Janeiro, seriam pães de sal ou franceses, no Ceará, carioquinhas, no Rio Grande do Norte, de água, em Pernambuco, de Jacó. Sem se importar com regionalismos, estava com água na boca, pronta para um café com pão.

“Café com pão
Café com pão
Café com pão[…]”

Foi depressa
Foi correndo
Foi na toda
Manteiga?
Agora sim!

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